Informação Especial - 05/10 - Publicada “Fratelli tutti”, a Encíclica social do Papa Francisco
Publicada “Fratelli tutti”, a Encíclica social do Papa
Francisco
Papa assina sua nova Encíclica junto ao túmulo de São Francisco de Assis
Fraternidade
e amizade social são os caminhos indicados pelo Pontífice para construir um
mundo melhor, mais justo e pacífico, com o compromisso de todos: pessoas e
instituições. Reafirmado com vigor o não à guerra e à globalização da
indiferença.
- Vatican
News -
Quais
são os grandes ideais mas também os caminhos concretos para aqueles que querem
construir um mundo mais justo e fraterno nas suas relações quotidianas, na vida
social, na política e nas instituições? Esta é a pergunta à qual pretende
responder, principalmente, “Fratelli tutti”: o Papa define-a como uma
"Encíclica Social" (6) que toma o seu título das
"Admoestações" de São Francisco de Assis, que usava essas palavras
"para se dirigir a todos os irmãos e irmãs e lhes propor uma forma de vida
com sabor do Evangelho" (1). A Encíclica tem como objetivo promover uma
aspiração mundial à fraternidade e à amizade social. No pano de fundo, há a
pandemia da Covid-19 que - revela Francisco - "irrompeu de forma
inesperada quando eu estava escrevendo esta carta". Mas a emergência
sanitária global mostrou que "ninguém se salva sozinho" e que chegou
realmente o momento de "sonhar como uma única humanidade", na qual
somos "todos irmãos". (7-8).
No
primeiro de oito capítulos, intitulado "As sombras dum mundo
fechado", o documento debruça-se sobre as muitas distorções da época
contemporânea: a manipulação e a deformação de conceitos como democracia,
liberdade, justiça; o egoísmo e a falta de interesse pelo bem comum; a
prevalência de uma lógica de mercado baseada no lucro e na cultura do descarte;
o desemprego, o racismo, a pobreza; a desigualdade de direitos e as suas
aberrações como a escravatura, o tráfico de pessoas, as mulheres subjugadas e
depois forçadas a abortar, o tráfico de órgãos (10-24). Estes são problemas
globais que requerem ações globais, sublinha o Papa, apontando o dedo também
contra uma "cultura de muros" que favorece a proliferação de máfias,
alimentadas pelo medo e pela solidão (27-28).
A
muitas sombras, porém, a Encíclica responde com um exemplo luminoso, o do bom
samaritano, a quem é dedicado o segundo capítulo,
"Um estranho no caminho". Nele, o Papa assinala que, numa sociedade
doente que vira as costas à dor e é "analfabeta" no cuidado dos mais
frágeis e vulneráveis (64-65), somos todos chamados a estar próximos uns dos
outros (81), superando preconceitos e interesses pessoais. De fato, todos nós
somos corresponsáveis na construção de uma sociedade que saiba incluir,
integrar e levantar aqueles que sofrem (77). O amor constrói pontes e nós
"somos feitos para o amor" (88), acrescenta o Papa, exortando em
particular os cristãos a reconhecerem Cristo no rosto de cada pessoa excluída
(85). O princípio da capacidade de amar segundo "uma dimensão
universal" (83) é também retomado no terceiro capítulo,
"Pensar e gerar um mundo aberto": nele, Francisco exorta cada um de
nós a "sair de si mesmo" para encontrar nos outros "um
acrescentamento de ser" (88), abrindo-nos ao próximo segundo o dinamismo
da caridade que nos faz tender para a "comunhão universal" (95).
Afinal – recorda a Encíclica - a estatura espiritual da vida humana é medida
pelo amor que nos leva a procurar o melhor para a vida do outro (92-93). O
sentido da solidariedade e da fraternidade nasce nas famílias que devem ser
protegidas e respeitadas na sua "missão educativa primária e
imprescindível" (114).
O
direito a viver com dignidade não pode ser negado a ninguém, afirma ainda o
Papa, e uma vez que os direitos são sem fronteiras, ninguém pode ser excluído,
independentemente do local onde nasceu (121). Deste ponto de vista, o Papa
lembra também que é preciso pensar numa "ética das relações
internacionais" (126), porque cada país é também do estrangeiro e os bens
do território não podem ser negados àqueles que têm necessidade e vêm de outro
lugar. O direito natural à propriedade privada será, portanto, secundário em
relação ao princípio do destino universal dos bens criados (120). A Encíclica
também coloca uma ênfase específica na questão da dívida externa: embora se
mantenha o princípio de que toda a dívida legitimamente contraída deve ser
paga, espera-se, no entanto, que isto não comprometa o crescimento e a
subsistência dos países mais pobres (126).
Ao
tema das migrações é, ao invés, dedicado em parte o segundo e todo o quarto
capítulo,
"Um coração aberto ao mundo inteiro": com as suas "vidas
dilaceradas" (37), em fuga das guerras, perseguições, catástrofes
naturais, traficantes sem escrúpulos, arrancados das suas comunidades de
origem, os migrantes devem ser acolhidos, protegidos, promovidos e integrados.
Nos países destinatários, o justo equilíbrio será entre a proteção dos direitos
dos cidadãos e a garantia de acolhimento e assistência aos migrantes (38-40).
Especificamente, o Papa aponta algumas "respostas indispensáveis"
especialmente para aqueles que fogem de "graves crises humanitárias":
incrementar e simplificar a concessão de vistos; abrir corredores humanitários;
oferecer alojamento, segurança e serviços essenciais; oferecer possibilidade de
trabalho e formação; favorecer a reunificação familiar; proteger os menores;
garantir a liberdade religiosa. O que é necessário acima de tudo" - lê-se
no documento -, é uma legislação (governance) global para as migrações que
inicie projetos a longo prazo, indo além das emergências individuais, em nome
de um desenvolvimento solidário de todos os povos (129-132).
O
tema do quinto
capítulo é "A política melhor", ou seja, a que representa
uma das formas mais preciosas da caridade porque está ao serviço do bem comum
(180) e conhece a importância do povo, entendido como uma categoria aberta,
disponível ao confronto e ao diálogo (160). Este é o popularismo indicado por
Francisco, que se contrapõe ao "populismo" que ignora a legitimidade
da noção de "povo", atraindo consensos a fim de instrumentalizar ao
serviço do seu projeto pessoal (159). Mas a melhor política é também a que
protege o trabalho, "uma dimensão indispensável da vida social" e
procura assegurar que cada um tenha a possibilidade de desenvolver as suas
próprias capacidades (162). A verdadeira estratégia contra a pobreza, afirma a
Encíclica, não visa simplesmente a conter os necessitados, mas a promovê-los na
perspectiva da solidariedade e da subsidiariedade (187). A tarefa da política,
além disso, é encontrar uma solução para tudo o que atenta contra os direitos
humanos fundamentais, tais como a exclusão social; tráfico de órgãos, e tecidos
humanos, armas e drogas; exploração sexual; trabalho escravo; terrorismo e
crime organizado. Forte o apelo do Papa para eliminar definitivamente o tráfico
de seres humanos, "vergonha para a humanidade", e a fome, porque é
"criminosa" porque a alimentação é "um direito inalienável"
(188-189).
A
política da qual há necessidade, sublinha ainda Francisco, é aquela centrada na
dignidade humana e que não está sujeita à finança porque "o mercado por si
só, não resolve tudo": os "estragos" provocados pela especulação
financeira mostraram-no (168). Assumem, portanto, particular relevância os
movimentos populares: verdadeiros "torrentes de energia moral", devem
ser envolvidos na sociedade, de uma forma coordenada. Desta forma - afirma o
Papa -, pode-se passar de uma política "para" os pobres para uma
política "com" e "dos" pobres (169). Outro desejo presente
na Encíclica diz respeito à reforma da ONU: perante o predomínio da dimensão
econômica, de fato, a tarefa das Nações Unidas será dar uma real concretização
ao conceito de "família de nações", trabalhando para o bem comum, a
erradicação da pobreza e a proteção dos direitos humanos. Recorrendo
incansavelmente à "negociação, aos mediadores e à arbitragem" - afirma
o documento pontifício - a ONU deve promover a força da lei sobre a lei da
força (173-175).
Do
sexto
capítulo,
"Diálogo e amizade social", emerge também o conceito de vida como
"a arte do encontro" com todos, também com as periferias do mundo e
com os povos originais, porque "de todos se pode aprender alguma coisa,
ninguém é inútil, ninguém é supérfluo" (215). Particular, então, a
referência do Papa ao "milagre da amabilidade", uma atitude a ser
recuperada porque é "uma estrela na escuridão" e uma "libertação
da crueldade, da ansiedade que não nos deixa pensar nos outros, da urgência
distraída" que prevalecem em época contemporânea (222-224). Reflete sobre
o valor e a promoção da paz, o sétimo capítulo, intitulado "Percursos dum
novo encontro", no qual o Papa sublinha que a paz é "proativa" e
visa formar uma sociedade baseada no serviço aos outros e na busca da
reconciliação e do desenvolvimento mútuo. A paz é uma "arte" em que
cada um deve desempenhar o seu papel e cuja tarefa nunca termina (227-232). Ligado
à paz está o perdão: devemos amar todos sem exceção - lê-se na Encíclica -, mas
amar um opressor significa ajudá-lo a mudar e não permitir que ele continue a
oprimir o seu próximo (241-242). Perdão não significa impunidade, mas justiça e
memória, porque perdoar não significa esquecer, mas renunciar à força
destrutiva do mal e da vingança. Nunca esquecer "horrores" como a
Shoah, os bombardeamentos atómicos em Hiroshima e Nagasaki, perseguições e
massacres étnicos - exorta o Papa - devem ser sempre recordados, novamente, para
não nos anestesiarmos e manterem viva a chama da consciência coletiva. E também
é importante fazer memória do bem. (246-252).
Parte
do sétimo
capítulo se detém, então, sobre a guerra: "uma ameaça
constante", que representa a "negação de todos os direitos",
"o fracasso da política e da humanidade", "a vergonhosa rendição
às forças do mal". Além disso, devido às armas nucleares, químicas e
biológicas que afetam muitos civis inocentes, hoje já não podemos pensar, como
no passado, numa possível "guerra justa", mas temos de reafirmar
fortemente "Nunca mais a guerra! A eliminação total das armas nucleares é
"um imperativo moral e humanitário"; em vez disso - sugere o Papa -
com o dinheiro do armamento deveria ser criado um Fundo Mundial para acabar de
vez com a fome (255-262). Francisco expressa uma posição igualmente clara sobre
a pena de morte: é inadmissível e deve ser abolida em todo o mundo. "O
homicida não perde a sua dignidade pessoal - escreve o Papa – e o próprio Deus
Se constitui seu garante" (263-269). Ao mesmo tempo, a necessidade de
respeitar "a sacralidade da vida" (283) é reafirmada onde
"partes da humanidade parecem sacrificáveis ", tais como os
nascituros, os pobres, os deficientes, os idosos (18).
No
oitavo
e último capítulo, o Pontífice se detém sobre "Religiões ao
serviço da fraternidade no mundo" e reitera que o terrorismo não se deve à
religião, mas a interpretações erradas de textos religiosos, bem como a
políticas de fome, pobreza, injustiça e opressão (282-283). Um caminho de paz
entre a religiões é, portanto, possível; por isso, é necessário garantir a
liberdade religiosa, direito humano fundamental para todos os crentes (279).
Uma reflexão, em particular, a Encíclica
faz sobre o papel da Igreja: ela não relega a sua missão à esfera privada
e, embora não fazendo política, não renuncia à dimensão política da existência,
à atenção ao bem comum e à preocupação pelo desenvolvimento humano integral,
segundo os princípios evangélicos (276-278).
Enfim,
Francisco cita o "Documento sobre a fraternidade humana em prol da paz
mundial e da convivência comum", assinado por ele mesmo em 4 de fevereiro
de 2019 em Abu Dhabi, junto com o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyib:
desta pedra miliar do diálogo inter-religioso, o Pontífice retoma o apelo para
que, em nome da fraternidade humana, o diálogo seja adoptado como caminho, a
colaboração comum como conduta, e o conhecimento mútuo como método e critério
(285).
Vatican News Service – IP
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Fonte:https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2020-10/a-nova-enciclica-social-fratelli-tutti.html